terça-feira, 10 de novembro de 2015

Inquietude

As noites escuras que toldam o raciocínio são uma pequena parte do terror diário que me invade. Um espaço ínfimo, de proporção e efeito, do que me rodeio, neste desassossego pantanoso que se converteram cada abrir de olhos pela manhã.

A insegurança de um sentimento que foi o que foi, amputado pelos bloqueios e umbigos próprios, num acordar expectante e nervoso. Cada dia é uma miragem de felicidade, rompida e estralhaçada aos primeiros acordes de sol.

A impotência de um fim anunciado, ao virar da esquina, distante ao som do já. Uma fuga que de corrida pouco tem. Mas não é o abanar resignado de uma cabeça que de obstinação já nada tem. É só o último canto do cisne que mantém as penas pretas.

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Perdi a mão

Perdi a mão que escrevia e a cabeça que sustentava os devaneios.
Talvez tenha encontrado a calma e paz necessárias para fugir deste exercício de escrita catatónico e de purificação dos meandros obsoletos da minha mente. Um refrescar de ideias inconstante, que me afasta desta tela em branco, que sujo com dizeres muito próprios quanto muito vulgares.

Perdi a mão que escrevia mas não a substituí. Mantém-se, inválida e serena, colada a um corpo que se transforma e desenvolve. Pede, volta e meia, ganha força para tomar a liderança e puxar pela mente. Puxar pelos sonhos e anseios, pelos dramas e ambições.

Perdi a mão que escrevia? Antes, escondia-a da minha vista, apesar de sentir o pulsar instintivo de colar nas palavras as ideias que me assaltam e dedilhar inconsequentes frases de catarse.

Palavras, como as outras

Sim, isto é para ti...
São palavras, como outras, mas minhas. 
Sim, isto é para ti...
São palavras que não vazias ou secas. São minhas, não são outras.
Sim, isto é para ti...
São palavras, já repetidas, que quero ver efeitos. Que quero que contem, as minhas, não as outras.
Sim, isto é para ti...
São palavras que vêm com gestos, momentos ou saudades. Estas, minhas, não outras.
Sim, isto é para ti...
São palavras, minhas, dedicadas a ti. Estas, não outras. 
Sim, sempre foram para ti...
Estas, as minhas.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

"Assim"

As coisas "assim", que nada mudam ou sequer encerram a promessa de alterações num futuro próximo. A falácia do copo meio cheio ou meio vazio, num deserto de emoções sorridentes.

São os dias pintados a ouro de bolsos vazios. De pensamentos estéreis. De inseguranças prementes. De falta de objetivos. De metas. Valores.

A fuga parece o caminho mais fácil, possível e imediato. Sedutor, até. Na natureza, tudo se transforma, nada se perde. Nas relações, um bocadinho de fé na ciência não é um remédio santo mas deixam a expectativa de todos os efeitos secundários. Vítimas colaterais? Sim, sem dúvida. 

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

domingo, 30 de agosto de 2015

Páginas em branco

Acordo com a página em branco. Já não entram as linhas que tão cuidadosamente teceste e entrelaçaste num delicioso acorde de silêncio. Sei que, ao abrir dos olhos, não cuido procurar o sossego nem cuido suspirar de uma ausência despreocupada. Sei que estarei livre de sobressaltos das expectativas furadas e jamais cumpridas.

Acordo com a página em branco. Não estarás para escrever as linhas que te habituaste, repletas de um desinteresse latente. Tirei-te a caneta da mão, afastei o lápis, rasguei a cor.

Acordo com a página em branco e serei eu a cuidar colocar, como me apraz a consciência, as linhas que me cosem.

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Escolher

Sou livre de palavras. Elas saltam pela sua ordem, na mesma medida e intensidade que chegam à cabeça. Mesmo que não de forma harmoniosa. Até mesmo por vezes não de forma coerente ou a obedecer à melodia que toca no pensamento. É uma escolha, como tantas que faço no dia a dia.

Da mesma forma que escolho as palavras, escolho por quem ou para quem as quero dedicar neste pensamento de incoerência ferido. Escolho porque quero. Porque me deixam. Ser ou não a escolha é uma consequência, tão aceitável quanto a água nos mares e as areias do deserto.

Continuarei a escolher, tal como as palavras escolherão a sua ordem, errantes no seu desejo e livre arbítrio. Se for escolhido, muito bem. As palavras continuarão a jorrar na mesma melodia. Desde que não parem nem sosseguem. Pois sem elas nada nos resta nem une. E a música cai.